2007

CARNAVAL 2007


Tema : A Coroação de Reis do Congo


Autor : Calé Alencar

A Coroação de Reis do Congo é o tema do Maracatu Nação Fortaleza para o desfile carnavalesco do ano de 2007, como forma de mostrar em seu cortejo o referencial e a riqueza da cultura tradicional, privilegiando uma temática relacionada com a origem do maracatu. A eleição de reis negros, presente em Portugal, na Espanha, na América espanhola, nas ilhas do Caribe e na América do Norte, teve na América portuguesa sua comemoração festiva mais difundida, existindo comprovadamente desde o início do século XVII, ganhando força no século XVIII, mudando de feições no século XIX e ocorrendo ainda hoje em várias localidades brasileiras, sobretudo nas áreas onde predominaram africanos de origem banto.

Festa anual realizada pela Irmandade de Nossa Senhora do Rosário dos Homens Pretos, quando reuniam-se escravos, mestiços e forros e iam buscar o casal régio em procissão, levando-os à igreja onde eram coroados durante a missa, a Coroação de Reis do Congo deu origem aos maracatus, tais como hoje existem nas festas carnavalescas de algumas cidades do nordeste brasileiro. A igreja de Nossa Senhora do Rosário de Fortaleza foi construída por negros escravos em 1730, tendo sido palco dos rituais de coroação dos reis negros, abrigando também a Irmandade de Nossa Senhora do Rosário dos Homens Pretos da Capital.

De acordo com o pesquisador José Ramos Tinhorão, da mesma forma que as músicas e danças dos negros conhecidas inicialmente por batuques e, depois, por sambas, originaram a criação, em todo o país, de numerosas formas musicais e coreográficas hoje integradas ao patrimônio cultural do povo, certos autos ou dramatizações da vida africana – como os referentes à Coroação de Reis do Congo, embaixadas e danças bélicas – iam constituir igualmente a matriz de vários autos e danças desde o século XVII integrados ao folclore e ao carnaval brasileiros.

A mais antiga dessas dramatizações de origem africana, acompanhada de sons de percussão e danças, é a Coroação de Reis do Congo, realizada no âmbito das Irmandades de Nossa Senhora do Rosário e que, antes de firmar uma tradição ligada à história dos escravos e seus descendentes crioulos no Brasil, constitui a mais antiga criação cultural dos africanos no próprio território de Portugal, a partir de meados do século XV. Foi na capela da Igreja de São Domingos de Lisboa, onde existia um altar de Nossa Senhora do Rosário, que os negros daquela cidade – documentadamente envolvidos com a confraria, embora de portas afora, desde 1505 – começaram a realizar a teatral solenidade da Coroação de Reis do Congo. E isso talvez desde 1520, e quase com certeza a partir de 1533, quando surge a primeira notícia expressa do funcionamento da Confraria de Nossa Senhora do Rosário dos Homens Pretos em Portugal.

Trazido ao Brasil, o costume de coroar os reis negros acontecia com a anuência dos senhores e da Igreja, desejosos de dar aos negros um dia de comemorações que lhes minorasse o sofrimento com o trabalho escravo, culminando com batuques, danças, comidas, bebidas e confraternização entre os cativos. Documentos colhidos por José de Liberato Barroso, referentes ao compromisso da Irmandade de Nossa Senhora do Rosário dos Homens Pretos da Capital, apontam para a presença de reis negros na organização da confraria em Fortaleza. Ainda segundo o compromisso, na manhã do dia da festa de Nossa Senhora do Rosário acontecia a eleição para os cargos de rei, rainha, juiz, escrivão, tesoureiro, procurador e mordomos. Segundo o historiador Gustavo Barroso, os últimos Reis do Congo coroados em Fortaleza foram Ana, conhecida como Aninha Gata, e Firmino, ex-escravo de seu pai.

Do ritual de coroação dos reis negros, surgiram o Auto dos Congos, em que duas embaixadas duelam (uma comandada por D. Henrique Cariongo e outra pela célebre rainha Ginga N’Bandi); e o maracatu, cortejo em reverência a uma rainha negra, localizado em Fortaleza ao final do século IXX, com a presença nas ruas dos maracatus do Outeiro, do Beco da Apertada Hora, do Morro do Moinho, da rua de São Cosme e o do Manoel Conrado. O maracatu seria incluído no desfile do carnaval de rua em Fortaleza a partir do ano de 1937. Segundo declarações do escritor Eduardo Campos, no Ceará existiram irmandades religiosas nas quais os escravos participaram com o consentimento de seus senhores. O ritual de coroação era composto de figuras como o rei, a rainha, o mestre de cerimônia, os mestres de campo e as açafatas, damas que carregavam um cestinho de flores chamado de açafato. Ainda de acordo com Eduardo Campos, a tradição do maracatu em Fortaleza teve origem com a Coroação de Reis do Congo, organizadas pela Irmandades de Nossa Senhora do Rosário dos Homens Pretos da Capital.

Fonte de Pesquisa

  • Marina de Mello e Souza, Reis Negros no Brasil Escravista – História da Festa de Coroação de Rei Congo, Editora UFMG, MG, 2002.
  • José Ramos Tinhorão, Os Sons dos Negros no Brasil, Art Editora, SP, 1988.
  • José de Liberato Barroso, Compilação das Leis Provinciais do Ceará, 1835 a 1861, Tipographia Universal de Laem, RJ, 1863.
  • Gustavo Barroso, À Margem da História do Ceará, Imprensa Universitária do Ceará, CE, 1962.
  • duardo Campos, O Cotidiano do Ceará Escravocrata, entrevista a José Anderson Sandes, jornal Diário do Nordeste, CE, 25.03.1998.

LOA

Auê auê auê auá
Auê auê auá
Com a bênção do Pai Oxalá
Nossa Senhora do Rosário
Pelas mãos sagradas do Ifá
No terreiro da Nação
Nossos reis vem coroar
A Coroação de Reis do Congo
Vem do reinado de Luanda
Vem das terras do okpê-lifá
Loa que tira bambê
Tambor que tira bambá
Bota os Reis do Congo no congado
Chama os reis pra nos abençoar
Dança que hoje tem maracatu
Eu sou Nação Fortaleza
Bate maracatucá
Auê auá